Tais obstáculos, contudo, são muito reais. O primeiro e um dos mais difíceis, diz respeito ao perdão. Desde o momento em que examinamos um desentendimento com outra pessoa, nossas emoções colocam-se na defensiva. Evitando encarar as ofensas que temos dirigido a outro, costumamos salientar, com ressentimento, as afrontas que ele nos tem feito. Isto acontece especialmente quando ele, de fato, tenha se comportado mal. Triunfalmente agarramo-nos à sua má conduta como a desculpa perfeita para minimizar ou esquecer a nossa.
Devemos, a essa altura, determo-nos imediatamente. Não faz sentido um autêntico beberrão roto, rir-se do esfarrapado. Lembremo-nos de que os alcoólicos não são os únicos afligidos por emoções doentias. Além do mais, geralmente é um fato que, quando bebíamos, nosso comportamento agravava os defeitos dos outros. Repetidamente, abusamos da paciência de nossos melhores amigos a ponto de esgotá-los e despertamos as piores reações naqueles que, desde o início, não gostaram de nós. Em muitos casos, estamos, na realidade, em frente a cossofredores, pessoas que tiveram suas aflições aumentadas pela nossa contribuição. Se estamos a ponto de pedir perdão para nós mesmos, por que não começar por perdoar a todos eles?
Ao fazer a relação das pessoas às quais prejudicamos, a maioria de nós depara com outro resistente obstáculo. Sofremos um choque bastante grave quando nos damos conta de que estávamos preparando a admissão de nossa conduta desastrosa, cara a cara, perante aqueles que havíamos tratado mal. Já foi bastante embaraçoso, quando em confiança, havíamos admitido estas coisas perante Deus, nós mesmos e outro ser humano. Mas a perspectiva de chegar a visitar ou mesmo escrever às pessoas envolvidas, agora nos parecia difícil, sobretudo quando lembrávamos a desaprovação com que a maioria delas nos encarava.
Também havia casos em que havíamos prejudicado certas pessoas que, felizmente, ainda desconheciam que haviam sido prejudicadas. Por que, lamentávamos, não esquecer o que se passou? Por que devemos considerar até essas pessoas? Essas eram algumas das maneiras com que o medo conspirava com o orgulho para impedir que fizéssemos uma relação de todas as pessoas às quais tínhamos prejudicado.
Alguns de nós, contudo, tropeçaram em um obstáculo bem diferente. Apegamo-nos à tese de que, quando bebíamos, nunca ferimos alguém, exceto a nós mesmos. Nossas famílias não sofreram porque sempre pagamos as contas e raramente bebemos em casa. Nossos colegas de trabalho não foram prejudicados, porque geralmente comparecíamos ao trabalho. Nossa reputação não havia sofrido, porque estávamos certos de que poucos sabiam de nossas bebedeiras e aqueles que sabiam nos asseguravam, às vezes, que uma boa farra, afinal de contas, não passava de uma falha de um bom sujeito. Que mal, portanto, havíamos cometido realmente. Certamente nada que não pudéssemos consertar com algumas desculpas banais.
É claro que esta atitude é o resultado final do esquecimento proposital. É uma atitude que só pode ser mudada por uma busca profunda e honesta de nossas motivações e ações.
Embora em alguns casos não possamos fazer reparação alguma, e em outros o adiamento da ação seja preferível, deveríamos, contudo, fazer um exame acurado, real e exaustivo da maneira pela qual nossa vida passada afetou as outras pessoas. Em muitas instâncias descobriremos que, mesmo que o dano causado aos outros não tenha sido grande, o dano emocional que causamos a nós mesmos foi enorme. Embora, às vezes, totalmente esquecidos, os conflitos emocionais que nos prejudicaram se ocultam e permanecem, em lugar profundo, abaixo do nível da consciência.