Título original: “La Oración de la Serenidad: Tanta substancia de A.A. en tan poca palabras”
Para os AAs de todos os lugares, a querida Oração da Serenidade é um mantra para toda ocasião imaginável; uma brisa refrescante em um rosto avermelhado pela ira, uma curta canção de gratidão por boas notícias, um guia consolador diante das más noticia, – a segurança reconfortante de que o mundo vai-se desenvolvendo como deve ser.
David R., de Oakland, Califórnia, diz: “Quando, num dia de calor escaldante, me encontro na rodovia 101 no meio de um congestionamento quilométrico, com centenas de caminhões parados devido a um acidente à frente, começo a recitar a Oração da Serenidade para me proteger contra a fúria da estrada, e obtenho o efeito desejado”. Karen M., de Richmond, Virgínia, diz que, “quando tenho que fazer alguma coisa que ameaça com um ataque de nervos, como por exemplo, pedir ao meu chefe um aumento no salário ou pedir desculpas por não ter feito bem alguma coisa, recito a Oração da Serenidade várias vezes e isso me tranquiliza como se fosse uma arte de mágica”. John D., de Chicago, diz que a oração “me ajuda tanto nos bons momentos quanto nos maus. Sempre aflora nos meus lábios de forma natural quando as coisas estão muito ruins, mas também trato de lembrá-la para agradecer a Deus quando as coisas estão indo bem, como no meu aniversário de A.A. ou nas raras ocasiões em que passo um fim de semana com a minha mulher”.
Este é o recorte do texto que apareceu em 1941 no New York Herald Tribune.
Bill W., cofundador de A.A., disse: “Nunca tínhamos visto tanta substância em tão poucas palavras”. No livro “Alcoólicos Anônimos atinge a maioridade”, Bill conta que no começo de 1942, Ruth Hock, a primeira secretária nacional de A.A., não alcoólica, mostrou a ele e a outros que se encontravam aglomerando o pequeno escritório de Nova York um pequeno obituário que tinha aparecido no Herald Tribune de Nova York que finalizava com estas palavras: “Deus, concede-nos a serenidade para aceitar as coisas que não podemos mudar, a coragem para mudar as coisas que podemos e a sabedoria para reconhecer a diferença”. (N.T.: a imagem que ilustra o parágrafo acima não faz parte da transcrição deste artigo).
Alguém sugeriu que essas linhas fossem impressas em pequenos cartões de visita e incluí-los na correspondência emitida pelo escritório e assim a Oração da Serenidade começou a fazer parte integrante da vida de A.A. Desde então, foi traduzida para os muitos idiomas falados pelos AAs no mundo todo e é proferida em voz alta nas reuniões e silenciosamente nos corações. Durante mais de meio século a oração veio se entretecendo tão intimamente na filosofia de A.A. que perece difícil aos membros lembrar que não teve origem na experiência de A.A.
Entretanto, a pesar de anos de investigação por parte de historiadores e inúmeras conjeturas por parte de amadores, a exata origem da Oração da Serenidade continua a ser um mistério. O que parece indiscutível é a reclamação de autoria feita pelo teólogo Reinhold Niebuhr, que numa entrevista disse haver escrito a oração como nota final de um sermão a respeito do cristianismo prático. Mesmo assim, Niebuhr admitiu alguma dúvida ao acrescentar
“supostamente, é possível que tenha estado muitos anos, inclusive séculos, aparecendo aqui e acolá, porém não acredito. Acredito sinceramente que eu próprio a escrevi”.
Com sua permissão, durante a Segunda Guerra Mundial a Oração da Serenidade foi impressa em cartões que foram distribuídos aos soldados americanos. Até então já tinha sido impressa pelo Conselho Nacional de Igrejas assim como também por Alcoólicos Anônimos.
Ao sugerir que a oração poderia ter aparecido aqui e acolá durante séculos, parece que Niebuhr estava certo. De acordo com Bill W.: “Ninguém pode dizer com segurança quem foi o primeiro a escrever a Oração da Serenidade. Alguns dizem que veio dos antigos gregos; outros que saiu da pena de algum poeta inglês anônimo e outros que foi escrita por um oficial da marinha americana”. Sua origem também foi atribuída a antigos textos sânscritos e aos distintos filósofos Aristóteles, Santo Agostinho, Tomás de Aquino e Espinosa. Um companheiro de A.A. encontrou entre “Os seis erros do ser humano” do escritor romano da antiguidade, Cícero, a seguinte frase:
“A tendência a se preocupar com coisas que não podem ser mudadas ou corrigidas”.
De fato, ninguém encontrou o texto da oração entre os escritos destas supostas fontes originais. O que certamente são muito antigos, como a citação de Cícero, são as questões da aceitação, a coragem para mudar o que pode ser mudado e a disposição para se desprender daquilo que está fora da nossa capacidade para ser mudado. Com certeza, a busca da origem dessa oração tem sido como descascar uma cebola e às vezes é preciso recomeçar de novo. Por exemplo, em julho de 1964, a Grapevine recebeu o recorte de um artigo publicado no Herald Tribune de Paris onde o correspondente informava ter visto em Koblenz, Alemanha, uma placa gravada com as seguintes palavras:
“Deus, concede-me o desprendimento para aceitar as coisas que não posso alterar; a coragem para alterar as coisas que posso alterar; e a sabedoria para distinguir uma coisa da outra”.
Finalmente parecia haver aqui uma prova concreta com citação, autor e data da Oração da Serenidade. Más não. Quinze anos mais tarde, em 1979, Peter T., de Berlim, disse a Beth K., membro do pessoal do ESG à época, que na sua primeira forma, a oração teve origem no filósofo romano Boécio (480-524), autor de “Os consolos da filosofia”.
Existem mais reclamações e, sem dúvida, irão continuar as descobertas nos anos vindouros. Entretanto, uma ideia compartilhada por muitos é a de que, a Oração da Serenidade, seja qual for sua origem, antiga ou moderna, parece ter surgido de uma percepção humana fundamental e de uma sabedoria nascida do sofrimento.
Fora o Pai-Nosso e a oração de São Francisco, não há outras palavras e conceitos, ao mesmo tempo práticos e espirituais, que tantos membros de A.A. levem gravados nas suas mentes e em seus corações na sua viagem de sobriedade em direção a uma nova maneira de viver.
Bill W. referiu-se a este fenômeno ao agradecer um amigo de A.A. que o presenteou com uma placa onde estava escrita a oração: “Na criação de A.A., a Oração da Serenidade foi um bloco de construção muito valioso, realmente uma pedra angular (*)”.
E falando em pedras angulares, mistérios e coincidências, um trecho da rua 120 de Manhattan, que ladeia o prédio onde se encontra o ESG, entre as ruas Riverside e Broadway, é conhecido pelo nome Reinhold Niebuhr Place.