Gratidão mais responsabilidade conduz, em A.A., a amar e servir, formando um círculo virtuoso no qual a mera submissão ao programa torna-se rendição incondicional, no rumo da sobriedade emocional.
O dicionário da Língua Portuguesa define a palavra amor como: “sentimento que induz a aproximar, proteger ou conservar quem ou o quê”, ou ainda, “grande afeição ou afinidade forte por algo ou alguém”. Já, a palavra servir é definida como: “ato ou efeito de servir; préstimo; trabalho; proveito; utilidade; uso”.
Explicar o sentido profundo da palavra amor em A.A. é difícil. Porém, conforme o Dr. Bob, se usarmos ambas as palavras acima, poderemos chegar a um entendimento.
Iniciei-me no serviço em A.A. ainda nos meus primeiros meses de abstinência, antes mesmo de saber o que significava. Apenas realizava as tarefas que me propunham, sem fazer ideia do que estava acontecendo ou mesmo por quê.
Até então, por não ter ligação com o serviço, eu começara a sentir certo tédio, além de algum pavor por presenciar algumas discussões mais acaloradas nas reuniões de serviço. O resultado foi previsível: comecei a afastar-me e, logo, já não participava das reuniões. Passei alguns meses sem contato com a Irmandade. Não bebi, mas esse é, para mim, um detalhe irrelevante, pois aprendi, muito tempo depois, que sobriedade não se resume à ausência de bebida. Ela é alcançada e mantida através da troca de experiências, forças e esperanças nas reuniões de grupo e através da prática dos Doze Passos sugeridos para a recuperação do alcoolismo.
Retornei às reuniões, não sem certa desconfiança. Observando a Quinta Tradição, percebi que gratidão não é suficiente. Além dessa característica essencial em A.A., a responsabilidade é aliada indispensável para que a gratidão converta-se em amor e serviço.
“A essência de todo progresso é a boa disposição para fazer as mudanças que conduzem ao melhor e, em seguida, a resolução de aceitar quaisquer responsabilidades que advenham dessas mudanças. (…) Na maioria dos aspectos de nossa vida, nós, AAs, temos podido fazer progressos substanciais quanto à nossa vontade e à nossa capacidade para aceitar e cumprir as nossas responsabilidades (…).” Essas foram as palavras de Bill.
Ouvi certa vez que, quando servimos, tentamos pagar a dívida que temos com A.A., que salvou nossa vida. Porém, aprendemos que, a cada entendimento, a cada despertar, descoberta ou amadurecimento – consequências inevitáveis do serviço –, nossa dívida cresce um pouco mais, de forma natural. Daí, continuamos servindo, ajudando e sendo ajudados. E esse ciclo recomeça com cada membro que vemos ingressar, cada evento bem realizado, cada vez que A.A. cumpre seu propósito.
Voltei a coordenar reuniões no grupo. Preparo um dos piores cafés já provados em A.A., mas dizem que estou melhorando. Sirvo na área e procuro estar à disposição para o que for necessário, pois, hoje, percebo o quanto preciso estar envolvida nessa atmosfera de amor que o serviço faz emanar. Compreendo haver encontrado meu caminho para a sobriedade – e isso quer dizer que volto a ele sempre que necessito, pois vejo que a sobriedade não é algo estático ou permanente. Bill, para não nos deixar esquecer, refletiu: “A sobriedade é tudo que devemos esperar de um despertar espiritual? Não, sobriedade é apenas um simples começo.” Algo a ser buscado a cada dia, hora ou momento de aflição, de perda da serenidade. A sobriedade emocional é a diferença entre eu estar realmente rendida ou meramente submissa ao programa.
Hoje, compreendo que o serviço presenteia-me com a possibilidade de contribuir, de algum modo, para que o alcoólico que ainda sofre também encontre o caminho de A.A. É necessário deixar esse caminho sempre à vista e sem obstáculos. Isso, igualmente, facilita minha caminhada.
Sempre que eu desanimo ou me ressinto com o serviço, repito novamente as perguntas: E quem se beneficia com o serviço? Quem tira proveito? A resposta nem sempre é imediata, mas é sempre a mesma: eu. Sempre tenho proveito por servir em A.A., principalmente por entender o que é amar e que seu alcance é infinito.
Hoje, procuro sempre lembrar as palavras de Bill: “Se temos que receber outras dádivas, nosso despertar tem que continuar. (…) A disposição para crescer é a essência de todo desenvolvimento espiritual.”
Anônimo BA Edição: 172 – Página: 8