O Livro Grande impresso pioneiro de A.A

Box 4-5-9, Inverno (Dez.) 2013 (pág. 3-4) 

Título original: “El Libro Grande: Pionero de A.A. impreso”

Faz setenta e cinco anos (em 2014) que foi publicada a primeira edição do livro Alcoólicos Anônimos – O Livro Grande (1), com as seguintes singelas palavras no início do seu Prefácio: “Nós, de Alcoólicos Anônimos, somos mais de cem homens e mulheres que nos recuperamos de uma aparentemente irremediável condição mental e física.

Demonstrar a outros alcoólicos exatamente como nos recuperamos é o principal objetivo deste livro. Por eles, esperamos que estas páginas sejam tão convincentes que nenhuma prova adicional seja necessária. Acreditamos que este relato de nossa experiência irá ajudar todos a melhor compreenderem o alcoólico. Muitos não compreendem que o alcoólico é uma pessoa muito doente. E, ademais, temos a certeza de que nossa maneira de viver é benéfica para todos” (pag. 11/1/1 do livro Alcoólicos Anônimos, Junaab, código 102).

Mais adiante, no capítulo intitulado “Há Uma Solução”, alguns dos pioneiros que compuseram este livro oferecem uma explicação adicional referente aos porquês e para quês: “Decidimos publicar um livro anônimo, expondo o problema assim como o vemos. Para esta tarefa traremos a combinação de nossa experiência e nosso conhecimento.

Nossa intenção é sugerir um programa útil para quem quer que se preocupe com o problema de bebida. É inevitável que abordemos questões médicas, psiquiátricas, sociais e religiosas.

Temos consciência de que estes tópicos são, por sua própria natureza, controversos. Nada nos agradaria mais do que escrever um livro que não contivesse material para discordâncias ou argumentações. Faremos o possível para atingir esse ideal. A maioria de nós percebe que a verdadeira tolerância em relação às falhas e aos pontos de vista alheios, e o respeito às suas opiniões, são atitudes que nos tornam mais próximos ao próximo.

Como ex-bebedores-problema, nossas próprias vidas dependem de nossa constante preocupação com os outros e com o modo pelo qual podemos ajuda-los” (pág. 49/3). E isto é exatamente o que Alcoólicos Anônimos vêm fazendo nos últimos 75 anos, facilitando aos alcoólicos do mundo todo um caminho rumo à recuperação. Traduzido para 70 idiomas, entre eles a linguagem por sinais norte-americano e braile, e em múltiplos formatos – impresso, em áudio e eletrônico, o texto básico de A.A., com vendas superiores a 40 milhões de exemplares, é um dos livros mais vendidos de todos os tempos. Em 2011 a revista Time incluía este livro na sua lista dos 100 livros mais influentes escritos em inglês desde 1923, ano em que a revista publicou seu primeiro número. Em 2012, a Biblioteca do Congresso (EUA), designou-o como um dos 88 “Livros que deram forma a América” (2).

Quando apareceu o Livro Grande a maioria das críticas foram boas. Uma crítica publicada na Revista da Associação Osteopata Americana disse que as histórias eram “fascinantes “e a Revista de Medicina de Nova Inglaterra animou a todos os que haviam tido que lidar com o problema do alcoolismo em algum momento das suas vidas a ler esta narrativa “estimulante”. Embora uma crítica publicada no The New York Times o qualificou como “um livro estranho “e “diferente de todos os livros anteriormente publicados”, o crítico, Percy Hutchinson, disse que “a tese de Alcoólicos Anônimos tem uma base psicológica mais sólida que qualquer outro tratamento do tema que já tenha lido”.

Do mundo da religião, o Dr. Harry Emerson Fosdick, ministro fundador da Igreja Riverside de Nova York e professor do Seminário Teológico União, qualificou o livro como “extraordinário”, merecedor de “uma atenção mais detida de toda pessoa interessada no problema do alcoolismo”. “Este livro”, escreveu, “fará possível ver, como nenhum outro trabalho conhecido por este leitor, o problema com que o alcoólico se defronta… O livro não é sensacionalista, em absoluto”. Acrescentou, “distingue-se pelo bom senso, a moderação e por estar livre de exageros e fanatismos. É um tratado sóbrio, cuidadoso, tolerante e compassivo do problema do alcoólico e as técnicas efetivas através das quais os coautores ganharam sua liberdade”.

Entretanto, nem todos os críticos, particularmente os da área da medicina, consideraram o livro digno de mérito. Uma crítica publicada no número de outubro de 1939 da Revista da Associação Médica Americana disse que o livro era “uma mistura estranha de propaganda promocional e exortação religiosa… em nenhum sentido um livro científico”.

A Revista de Enfermidades Nervosas e Mentais disse que o Livro Grande era “de muitas palavras… uma espécie de incoerente reunião de acampamento… Do profundo significado do alcoolismo há pouco mais que uma palavra. Tudo é superficial”. A seguir, a crítica “degradou” o alcoólico: “De vez que o alcoólico, de maneira geral, vive uma regressão infantil de satisfação dos desejos para chegar ao estado ilusório de onipotência, talvez o melhor tratamento, ao menos por enquanto, seja através dos métodos regressivos de psicologia de massas dentro dos quais, sabe-se, os fervores religiosos se encaixam e, por isso o livro tem essas tendências religiosas”.

Entretanto, na medida em que o livro se ia firmando, com vendas de mais de 300.000 exemplares durante os primeiros 15 anos, foi chegando a um público cada vez mais amplo. Depois da publicação da segunda edição do livro em 1955, um crítico disse que as páginas do livro já eram uma lenda americana e “assim continuaria a ser por toda história da buscada maturidade do ser humano”.

Mais tarde, com a publicação da terceira edição em 1976, o Dr. Abraham Twerski, diretor do Centro de Reabilitação Gateway, escreveu no Boletim Trimestral de Assistência aos Empregados: “Os Doze Passos são um protocolo para a personalidade, o desenvolvimento e auto realização, um processo valioso inclusive para o indivíduo não alcoólico ou não adicto. Assim, mesmo que a ciência descubra algum dia uma solução fisiológica para os efeitos destrutivos do álcool, o livro continuará tendo seu valor enriquecedor”. Agora, na quarta edição, o livro tocou as vidas de alcoólicos de todas as partes do mundo ensinando-lhes, tal como descrito no prefácio à primeira edição “exatamente como nos recuperamos”.

A composição do livro foi um trabalho de vários meses e, em maio de 1938, quando começaram a ser redigidos os primeiros rascunhos, Bill W. estava sóbrio havia pouco mais de três anos e meio, o Dr. Bob um pouco menos de três anos, e os demais cem membros pioneiros que contribuíram de alguma maneira para a redação do livro tinham entre alguns meses e não mais que dois anos de sobriedade.

Os variados rascunhos foram intercambiados através de correio postal entre Nova York e Akron. Depois que os membros nova-iorquinos houvessem revisado cada capítulo, era a vez dos akronitas oferecer seus comentários e opiniões a respeito. Para dar ao livro certa credibilidade médica, O Dr. William D. Silkworth concordou em escrever uma introdução. Naquele então chefe clínico do Hospital Towns de Nova York, o Dr. Silkworth foi, de acordo com Bill W., “um autêntico fundador de A.A.

Dele aprendemos qual era a natureza da nossa doença. Facilitou-nos os instrumentos para desinflar o ego alcoólico mais resistente e aquelas frases demolidoras com que descrevia nossa doença: a obsessão mental que nos obriga a beber e a alergia física que nos condena à loucura ou à morte”.

Foi uma das pessoas não alcoólicas que, nos primeiros dias, arriscaram sua reputação profissional para dar à Irmandade o apoio que tanto necessitava. Sua introdução à primeira edição intitulada “A Opinião do Médico”, continua a fazer parte atualmente das páginas preliminares do Livro Grande. Além de falar sobre o texto proposto nas suas reuniões de Nova York e Akron, os AAs pioneiros decidiram solicitar comentários aos seus amigos não alcoólicos para se assegurar que não haveria erros médicos nem materiais ofensivos a pessoas das várias religiões.

Um dos comentários mais importantes para o futuro da Irmandade foi feito por um psiquiatra de Nova Jersey. Ele fez notar que o texto do manuscrito original estava repleto de afirmações e sentenças do tipo “você tem que…”. Sugeriu substituí-las, quando possível, por expressões tais como “nós devemos “ou “nos resultaria mais útil”. “Coloquei um frágil argumento contrário a essa sugestão”, disse Bill W., “mas logo me rendi; estava perfeitamente claro que o doutor tinha toda razão”. A mudança do foco de um livro didático para um texto mais suave contribuiu para tornar o livro mais acessível. Na versão conhecida pelos leitores atualmente, o Quinto Capítulo começa: “Raramente vimos alguém fracassar tendo seguido cuidadosamente nosso caminho” (pág. 87/1), frase esta que, na versão original, referia-se a “uma pessoa que seguiu nossas diretrizes”.

Da mesma maneira, a frase que apareceu no original “Se você chegou à conclusão de que quer o que nós temo se deseja fazer todo o possível para obtê-lo, então está pronto para seguir as instruções”, a última parte foi substituída por “… então está pronto para dar alguns passos” (pág. 87/2/3); e, no parágrafo seguinte, onde originalmente estava escrito “Mas há alguém que tem todo o poder – este alguém é Deus. Você tem que encontra-Lo agora”, foi suavizado para “…Que você possa encontra-Lo agora”.

Frases como, por exemplo, “O requisito principal é.…”não saiu do processo de revisão, e as palavras “Agora acreditamos que você irá consegui-lo…” colocadas antes de “Eis os passos quedemos…” (pág. 83/2/1), foram eliminadas.

Felizmente, para milhares de alcoólicos e suas famílias, seus patrões e amigos atuais, o texto já não diz mais: “Se ainda não se convenceu de que estes assuntos são de importância vital, deverá voltar a ler o livro até este ponto do texto ou jogá-lo no lixo”.

No final de sua narrativa a respeito da composição do livro em A.A. Atinge a Maioridade, Bill W. deixou bem claro que tinha valido a pena ter passado por todas as discussões e discórdias: “Há que ressaltar aqui, que a criação do livro Alcoólicos Anônimos suscitou muito mais do que disputas a respeito de seu conteúdo. À medida em que o volume ia sendo completado, mais convencidos ficávamos de que estávamos no bom caminho.

Vislumbrávamos o que o livro poderia chegar a ser e a fazer. Para nos animar mantínhamos constantemente elevada a esperança e uma firme confiança. O barulho das nossas disputas anteriores parecia-nos com o som de um trovão que se distanciava. Vimos os céus despejados e claros. Todos nos sentíamos bem”. A data oficial da publicação do Livro Grande em inglês, de acordo com o Escritório de Copyright dos EUA, é o nove de abril de 1939.

Houve uma tiragem de 4.730 exemplares encadernados em tecido na cor vermelha, com colunas largas, papel grosso e sobrecapa nas cores vermelho, amarelo e preto. Para comemorar esta primeira edição – e o 75º aniversário do livro, A.A.W.S. (Serviços Mundiais de A.A.) irá publicar uma edição fac-símile, com papel da mesma espessura e com a mesma sobrecapa, encadernação e conteúdo. Para maiores informações entrar em contato com o ESG (Nova York) ou visite: www.aa.org.

PARA ENTENDER MELHOR:

(1) -. O Livro Grande ou, The Big Book, é o nome comum nos EUA e Canadá para o livro intitulado Alcoólicos Anônimos. É o texto básico da Irmandade de Alcoólicos Anônimos que foi publicado pela primeira vez em 1939- antes que o movimento inicial tivesse ainda um nome. Mais tarde, esse movimento de alcoólicos ficou conhecido como Alcoólicos Anônimos e, assim, houve certa confusão com os nomes do Livro e da Irmandade por compartilharem o mesmo nome. A Irmandade é um grupo de pessoas.

O livro é o texto básico e manual de instruções para os interessados em aprender, aplicar e praticar os princípios do programa de recuperação de 12 passos do A.A. Na Europa e em outros lugares (inclusive no Brasil) muitas vezes é chamado de “O Livro Azul” (The Blue Book).