Para ser membro de A.A.

Basta o desejo de parar de beber

Olá,

Retomamos contato consigo para abordar, desta vez, o aspecto de quem pode tornar-se membro de Alcoólicos Anônimos.  Conforme nossa Terceira Tradição, “Para ser membro de A.A., o único requisito é o desejo de parar de beber”. O enunciado integral afirma que não podemos “recusar quem quer que deseje recuperar-se. A condição para tornar-se membro não deve nunca depender de dinheiro ou formalidade”.

Qualquer pessoa pode declarar-se membro, se assim o quiser. Ninguém poderá mantê-lo de fora. Quem quer que seja, por mais baixo que tenha chegado, por mais graves que sejam suas complicações, até seus crimes, não terá negada sua acolhida em A.A. Não tememos que alguém nos faça mal, por mais perverso e violento que seja: “Queremos apenas ter certeza de que todos os alcoólicos que assim o queiram terão a mesma oportunidade de chegar à sobriedade que nós tivemos. De modo que qualquer pessoa será membro de A.A. a partir do instante em que assim se declarar”.

No início do movimento que gerou A.A. havia muitas restrições para aceitar novos membros, éramos quase secretos. Ao receber com reservas candidatos com outros perfis (negros, mulheres, gays, dependentes de outras substâncias, jovens), nossos pioneiros observaram que, na verdade, estavam com receio de serem, eles próprios, julgados pela sociedade com base nos preconceitos que até então cultivavam – temiam mais por suas reputações pessoais do que por qualquer problema que tais pessoas pudessem, de fato, causar.

Felizmente, logo ficou claro para todos que, se todas as regras até então existentes fossem compiladas num só regulamento, ninguém, dentre os que já estavam nas fileiras de A.A., poderia ter ingressado! Percebeu-se que toda regra para ingresso resumia-se ao fenômeno do “roto falando do esfarrapado”. Então, todas elas foram abandonadas.

Hoje está consolidado o aprendizado, entre nós, de que a condição que temos em comum – sermos portadores de alcoolismo –, juntamente com o profundo desejo que temos em comum – o de sermos libertados das angústias dessa doença e vivermos sóbrios, úteis e felizes – formam vínculos mais profundos e duradouros do que qualquer diferença que possamos ter entre nós: de renda, etnia, escolaridade, credo religioso, orientação sexual, idade, nacionalidade, posição política ou o que for.

Tal percepção permitiu-nos desenvolver uma organização na qual a diversidade humana e a pluralidade de pontos de vistas e de modos de ser constituem um fator a mais de fortalecimento da reabilitação individual, pela rica troca de experiências, forças e esperanças que ocorre entre criaturas tão iguais e tão diferentes entre si.

A Terceira Tradição tem, ainda, uma implicação pouco visível, mas não menos real: A.A. não é para quem precisa; é para quem deseja tornar-se membro. Aceitamos abordar qualquer pessoa, em qualquer hora e lugar, desde que esteja ciente e aceite conversar conosco. Não persuadimos ninguém a parar de beber.  Hoje em dia, um recém-chegado não precisa sequer admitir ser um alcoólico. Não exigimos abstinência de ninguém. Adotamos livremente a sobriedade como modo de vida e acolhemos quem mais queira aderir. Se o álcool é considerado um problema incontrolável para alguém e este alguém deseja fazer algo a respeito, isso é suficiente para nós.

Por outro lado, acolhemos alcoólicos que chegam até nós por imposições de diversas ordens e externas a Alcoólicos Anônimos, por exemplo: sentenças judiciais, ultimatos familiares, indicações médicas ou exigências de empregadores. Não nos cabe questionar as autoridades constituídas no âmbito da vida social. Apenas deixamos claro que, em A.A. inexiste autoridade humana: nenhum membro pode forçar outro a sair, nem a ficar.

Outra implicação menos visível é a de que ninguém que não seja alcoólico pode tornar-se membro de A.A. Por exemplo, um dependente de outras substâncias – ou qualquer outro perfil – será acolhido incondicionalmente se tiver uma trajetória real de beber descontrolado.  A própria história de A.A. demonstrou que não há nenhum meio possível para fazer um não alcoólico tornar-se membro de A.A. – precisamos limitar nossos grupos de A.A. a um único propósito, ou fracassaremos – e, se fracassarmos não poderemos ajudar ninguém.

Contudo, há uma categoria de pessoas que, embora não sendo rigorosamente de membros de A.A., funciona como se o fossem: trata-se dos profissionais não alcoólicos que, carinhosamente, chamamos Amigos de A.A. São historicamente responsáveis por uma parcela incalculável do desenvolvimento de A.A. no mundo e no Brasil, pois aceitam nossa cooperação, indicam potenciais futuros membros para visitarem nossos grupos, confraternizam conosco no cotidiano e são sempre bem-vindos às reuniões abertas de quaisquer dos nossos grupos. Com estes, temos uma dívida de gratidão eterna e alguns dentre eles têm servido como Custódios da Junta de Serviços Gerais de A.A. do Brasil, um órgão de serviço da nossa estrutura nacional, emprestando seu nome, reputação e autoridade à nossa Irmandade, atuando como rosto e voz de A.A. em nível público, pois, não sendo alcoólicos, não precisam guardar anonimato pessoal nesse nível

Mas, voltando aos alcoólicos, de todo modo, nossa absoluta abertura para acolhê-los, expressa na Terceira Tradição de A.A., significa, talvez que estamos perdendo totalmente o medo daquelas violentas tempestades emocionais que às vezes cruzam nosso mundo alcoólico; talvez mostre nossa confiança de que, depois da tempestade, vem a bonança – “uma calma que é mais compreensão, mais compaixão, mais tolerância do que qualquer outra que jamais conhecemos” e que leva-nos a amar o melhor nos outros, sem temer seu pior.

Fraternamente,

Junta de Serviços Gerais de Alcoólicos Anônimos do Brasil

Comitê Trabalhando com os Outros